quinta-feira, 10 de maio de 2007


CASTELO DE VIDE EM 1758

(continuação)



19ª

Tem esta vila feira dia de Santo Amaro e dia de São Lourenço, francas de um só dia cada uma, e mercados todas as quintas-feiras do ano, francos até ao meio-dia.

20ª

Tem correio. Sai quarta de manhã e chega sábado à noite. Manda correio a carta do povo, dar e receber as cartas ao correio de Portalegre.

21ª

Dista esta vila da cidade de Portalegre, cabeça do bispado, duas léguas. E dista da cidade de Lisboa 34 léguas.

22ª

Tem o privilégio de não sair da Coroa e com tanta restrição que, em foro de consciência, a não pode el-rei dar, porque sendo esta vila das filhas do infante Dom Afonso, quando a venderam a seu tio Dom Dinis, se estipulou no contrato que a vendiam a ele e a seus sucessores, com condição que nunca sairia da Coroa. E el-rei no contrato assim o prometeu. Consta da Monarquia Lusitana.
Tem mais o privilégio dos seus moradores não irem à guerra, salvo acompanhando el-rei em pessoa. E se tem observado na ocasião dos maiores apertos, como se vê no livro do tombo da Câmara.
Tem o privilégio de não pagar portagem e a todos os moradores da vila o privilégio que a Elvas se concedeu, só os que morassem na Corujeira.
Tem também isenção de ter éguas de coudelaria e este é o único que se tem quebrado.

23ª

Há nesta vila a fonte da Mealhada, cuja água é excelente remédio contra as dores nefríticas, a do Manguinhos, para as diarréias.

24ª

Nada

25ª

É praça de armas, fortificação irregular e de mediana força, o recinto grande.
Para a parte do nascente tem o forte de São Roque, que é de quatro baluartes de força mediana.
No alto da vila tem o seu castelo. É talvez o mais grande e formoso que tem toda a raia do reino. Está em um alto dominante, por algumas parte inacessível. É castelo antigo e por fora o fortificaram com fortificação moderna desenhada por Cosmander. Se se aperfeiçoasse, era capaz de resistir a um poderoso exército.

26ª

Só padeceu no terramoto ruínas ordinárias.

27ª

O padre Carvalho na sua Corografia escreveu com acerto o estado presente e a terra aonde se pode ver o que escuso de referir. Só cometeu dois erros. Um foi dizendo na vila da Póvoa que a sua igreja era filial de Santa Maria desta vila, sendo da de Sant’ Iago. O outro foi o dizer ser opinião se chamava “Castelo da Vide” por dividir Castela de Portugal, sendo isto história apócrifa. As mesmas armas que lhe dá lhe desfazem o seu dito, que é um castelo cercado com uma vide com cachos de ouro, o que lhe vem porque esta vila se chamava só vila da Vide até o tempo de el-rei Dom Dinis, como se vê da doação que el-rei Dom Afonso III ao infante seu filho, na qual lhe dá a vila da Vide, com seu castelo, seus termos e suas pertenças.
A vila é antiquíssima. No tempo dos gentios havia aqui fábrica das ferrarias, que ainda conserva o nome. Ainda estão em pé oito ou nove antas, em que faziam os sacrifícios.
O castelo é antiquíssimo. O poço que tem dentro para se beber em tempo de sítio é de enorme despesa e bem se vê que em país aonde há tantos e tão grandes nascimentos de águas, só se faria aquela obra para defesa do castelo. Chamam ao poço “Alvacá”, nome mourisco. Ou os mouros o fizeram ou, achando-o feito, lhe puseram aquele nome.
No princípio da conquista do reino foi o castelo acometido e raso pela parte do norte, cuja muralha se vê hoje servindo de traseira à cadeia e outras casas. Esta ruína quis concertar o infante Dom Afonso, de que el-rei Dom Dinis seu irmão teve grandes ciúmes e veio pôr sítio a Castelo de Vide. O irmão, o infante, lhe escreveu de Arronches carta, prometendo-lhe que mandaria derrubar tudo o que tinha concertado nos muros e acrescentado na torre. Do que se vê o erro crassíssimo de muitos autores, que dizem que el-rei Dom Dinis povoara esta terra e fizera o castelo. El-rei Dom Afonso o 4º alargou o castelo, como se vê do letreiro que está sobre a porta dele, metendo no seu recinto todo o terreno por foi acometido o castelo velho.
E ficou tão formoso e grande que deu o nome à vila, tomando-o por armas e cercando-o com a vide, aludindo ao nome da antiga vila.
É erro crassíssimo de Duarte Nunes de Leão dizer que esta vila era naquele tempo aldeia, lugar aberto e chão do termo de Marvão. E padeceu este erro porque na explicação que el-rei Dom Afonso III fez à doação que tinha feito por estas palavras “quod est in termino de Marvão”, ali foi o mesmo que dizer “junto a Marvão” para diferençar esta vila da Vide da outra vide da Serra da Estrela, a que bem se vê das palavras da doação feita antes, em que lhe chama vila da Vide com seu castelo e seu termo e suas pertenças. Nem Marvão nesse tempo tinha termo separado, como se vê de sentença pouco depois dada e e sempre Marvão foi terrúncula [sic].
Tocante à serra está dito o que dela se pode dizer. Apenas temos de acrescentar: é um braço do Hermínio Menor, que aqui acaba. Os outros braços vão para Marvão, Portalegre, Alegrete. Tem infinidade de ervas medicinais.
Rio especial não o há. As ribeiras, pequenas, na Corografia Portuguesa estão bem escritas.

Castelo de Vide, 24 de Maio de 1758

O Prior Manuel Carrilho Gil
(continua)

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