segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Lenda do ataque dos mouros a Marvão

Versão de Marvão. Recolhida por Maria Guadalupe Alexandre e publicada por Ruy Ventura (2005) – Contos e Lendas da Serra de São Mamede, antologia breve, Almada, Associação de Solidariedade Social dos Professores: 65.

Há muito tempo os mouros atacaram o castelo de Marvão e, ao subirem a encosta sul, ao chegarem a meio acamparam para fazerem um culto a Alá e ergueram ali uma espécie de ermida.
Nessa mesquita eram sacrificados os cristãos e eram depositadas as armas que lhes eram apanhadas em combate.
No local foi encontrado um crânio, atravessado com um prego. Dizem as pessoas que esse crânio pertencia ao senhor do castelo de Marvão, que aí sofrera um terrível martírio.
Quem encontrar as armas do senhor do castelo de Marvão terá o perdão de Deus, mas tem que entregá-las ao convento de Nossa Senhora da Estrela.
Lenda da construção do castelo de Marvão

Versão de Galegos (Marvão) contada por “ũa velha” em finais do século XVI e recolhida por Diogo Pereira Sotto Maior (1984) – Tratado da Cidade de Portalegre, (introdução, leitura e notas de Leonel Cardoso Martins), Lisboa, INCM / Câmara Municipal de Portalegre: 40.

[V]indo […] a Medóbriga um mouro de África e vendo ali certa senhora portuguesa muito fermosa, se enamorou dela, e cometendo tratar casamento, ela lhe respondeu que, se ele levantasse ũa fortaleza no alto daquelas rochas que pareciam, se casaria com ele, parecendo-lhe cousa impossível. O mouro, vendo-se tam preso da sua galhardia e fermosura, prometeu de a fazer dentro de ũa noite. E quando ao outro dia amanheceu, as torres da fortaleza estavam parecendo. A senhora, vendo-se convencida e obrigada pela palavra, se deitou de ũa varanda abaixo e se matou, por não se ver casada com um mouro.
Lenda de Marvão

Versão de Galegos (Marvão) contada por “uns velhos” em finais do século XVI e recolhida por Diogo Pereira Sotto Maior (1984) – Tratado da Cidade de Portalegre, (introdução, leitura e notas de Leonel Cardoso Martins), Lisboa, INCM / Câmara Municipal de Portalegre: 40.

[Q]uando Medóbriga fora conquistada e distruída por Cássio Longino, que muita parte da gente fugira com molheres e mininos pera aquelas rocas e penedias e, como a subida é tão agra, (e ainda naquele tempo seria pior, pois não era tam frequentada) iam caindo, uns por ũa parte, outros por outra, fugindo da morte e dos perigos que a guerra, com suas pressiguições traz consigo. E assi começaram a bradar uns pera os outros dizendo: “Malvão, Malvão”. E daqui, mudado o l em r, se chamou Marvão.
PATRIMÓNIO RELIGIOSO
DO CONCELHO DE PORTALEGRE
(Inventário de existências e inexistências)



PORTALEGRE(Freguesias de São Lourenço e Sé)

- Bernardas, cruzeiro do convento das
- Bernardas, oratório / passo do convento das (**)
- Calvário, cruzeiro do
- Calvário, igreja do
- Cemitério, cruzeiro do
- Corro, cruzeiro do (***)
- Espírito Santo, igreja do (**)
- Estrada de Santana, oratório / alminhas da
- Hospital, capela do
- Imaculado Coração de Maria, igreja e seminário do
- Largo da Sé, oratório / passo do (**)
- Largo de Santo Agostinho, oratório (**)
- Nossa Senhora da Assunção (Sé Catedral), igreja de
- Nossa Senhora da Conceição ou das Bernardas, igreja e convento de (**)
- Nossa Senhora da Penha (Penha de São Tomé), igreja de
- Nossa Senhora das Calçadas (Monte de Santo António), capela ou oratório de (**)
- Nossa Senhora de Belém (Covas de Belém), capela de
- Nossa Senhora do Socorro (Herdade da Cabaça), capela de
- Penha de São Tomé, cruzeiro do
- Quinta da Laje, capela da (**)
- Rossio, oratório / passo do
- Rua de Santo André, alminhas da
- Rua do Bargado, oratório da
- Santa Ana, igreja de
- Santa Clara, igreja e convento de (**)
- Santa Maria a Grande ou dos Agostinhos, igreja e convento de (**)
- Santa Maria do Castelo, igreja de (*)
- Santa Maria Madalena, igreja de (*)
- Santo André, igreja de (*)
- Santo António (Assentos), igreja de
- Santo António, igreja e mosteiro de (**)
- Sant’ Iago Maior, igreja de
- São Bartolomeu, igreja de (*)
- São Bento, capela de (*)
- São Brás, igreja “nova” de (*)
- São Brás, igreja “velha” de (**)
- São Cristóvão (Atalaião), igreja de
- São Francisco, igreja e convento de (**)
- São João Baptista ou Misericórdia, igreja de (**)
- São Lourencinho ou São Lourenço do Picoto, igreja de (*)
- São Lourenço, igreja de
- São Mateus, igreja de (**)
- São Martinho, igreja de (*)
- São Pedro, igreja de (**)
- São Sebastião, igreja e colégio de (**)
- São Tomé (Penha de São Tomé), igreja de (***)
- São Vicente, igreja de (*)
- Senhor Jesus da Forca (Ribeiro de Baco), capela do (*)
- Senhor Jesus do Bonfim, cruzeiro da igreja do
- Senhor Jesus do Bonfim, igreja do


ALAGOA
(São Miguel Arcanjo)

- São Miguel, igreja de



ALEGRETE
(São João Baptista)

- Calvário, igreja do (**)
- Espírito Santo, igreja do (**)
- Misericórdia, igreja da
- Nossa Senhora da Lapa (Besteiros), igreja de
- Nossa Senhora de Fátima (Vale de Cavalos), igreja de
- Santa Maria ou Santa Ana, igreja de (*)
- São João Baptista, igreja de
- São Pedro, igreja de (***)



CARREIRAS
(São Sebastião)

- Almas, cruzeiro das
- Alminhas da Rua da Outra Rua (***)
- Alminhas, oratório das
- Barroca, cruzeiro da (*)
- São Sebastião, igreja de



FORTIOS
(São Domingos de Gusmão)

- Santa Clara, capela de (**)
- Santa Maria Madalena (Herdade da Madalena), igreja de (***)
- Santa Marta (Mata), igreja de (*)
- São Domingos, igreja de (***)
- São João Baptista (Herdade da Almojanda), capela de
- São Miguel (Quinta do Carvalhal), capela de (**)
- São Sebastião, igreja de
- Senhor Jesus dos Aflitos (Herdade da Pelica), igreja do



REGUENGO
(São Gregório Magno)

- Jesus, Maria, José ou de São Jorge (Quinta de Campos), capela de
- Nossa Senhora das Dores (Quinta da Lameira), capela de
- Quinta dos Cantarinhos, capela da (**)
- São Gregório Magno, igreja de
- São Mamede (Serra de São Mamede), igreja e mosteiro de (**)



RIBEIRA DE NISA
(Nossa Senhora da Esperança)
- Nossa Senhora da Esperança, cruzeiro da igreja de
- Nossa Senhora da Esperança ou de Santo António, igreja e mosteiro de
- Nossa Senhora de Fátima (Vargem), igreja de
- São Bento (Quinta de São Bento), capela de
- São Brás (Provença), igreja e mosteiro de (***)



SÃO JULIÃO
(São Julião de Toledo)

- Santo António (Monte Francisco), igreja de
- São Julião de Toledo (Igreja), igreja de



URRA
(São Tiago Alfeu ou Menor)

- Monte dos Apóstolos, cruzeiro do (***)
- Sant’ Iago Menor, cruzeiro da igreja de
- Sant’ Iago Menor (Sant’ Iago de Caiola), igreja de
- São Tomé (Abrunheira), igreja de (*)


(*) Monumento desaparecido.
(**) Monumento profanado e/ou com utilização não-religiosa.
(***) Monumento arruinado.

Igreja de Santa Maria ou de Santa Ana
(Alegrete)


Quanto no ano de 1725 o doutor João de Sequeira Sousa, juiz de fora de Arronches, se dirigiu a Alegrete para proceder à medição do local onde existira a igreja de Santa Ana, já nada se conseguia vislumbrar deste antigo templo. Ainda assim, a memória serviu de auxiliar: “fomos ao Sitio que hoje se chama de Santa Anna junto á muralha do Castello da parte de fora da parte de Santa Maria por sima da Igreja de São Pedro para effeyto de demarcar o terreno da Igreja que tinha sido da Senhora Santa Anna e por se não descubrir a largura, nem o cumprimento, mas somente se verificar que naquele sitio tinha sido por assim o depor o Sargento mor Gregorio Mergulhão, e os louvados afirmarem o ouvirem dizer geralmente mandou o dito Juis de fora, e tombo firmar hum marco com quatro testemunhas para a todo o tempo constar”.
Este extracto do Tombo dos bens da Capella de Santa Anna, guardado no Arquivo Distrital de Portalegre, prova-nos que a igreja já não existia no primeiro quartel do século XVIII. Aponta ainda uma localização precisa para o monumento desaparecido: junto à Porta de Santa Maria, encostado às muralhas, sobre a igreja de São Pedro.
A invocação de Santa Ana, mãe da Virgem Maria, é no entanto tardia na história deste templo, aparecendo unicamente a partir da década de 70 do século XVII. Antes dessa data, a igreja era de Santa Maria ou de Nossa Senhora, dando origem inclusivamente à designação toponímica de uma das portas das muralhas de Alegrete. Teve origem numa capela (legado pio) instituída por Vasco Anes e outros benfeitores, colocada sob a protecção da Virgem. Dotada com vastas propriedades no concelho de Alegrete e noutros limítrofes, era administrada pela Câmara da vila, à qual pertencia “a nomeação e elleyção de administrador, e capellão, Cuja elleyção sua Magestade constuma confirmar plo seu Dezembargo do Passo”.
Desconhecemos a data desta instituição. A situação não era diferente da que existia no início do século XVIII: “por ser muyto antiguissima não há notiçia della, tendose feyto exactas deligençias tanto nos Cartorios desta Vila, Como no desta Provedoria [de Portalegre]”. Deveria remontar, contudo, à Idade Média, tendo em conta que já existia na segunda metade do século XV.
O primeiro documento em que claramente se menciona a igreja de Santa Maria data de 1477. Nesse ano, a 5 de Maio, uma carta dada em Évora em nome de D. Afonso V, mas assinada pelo futuro D. João II, então príncipe regente, nomeia Lopo Vaz de Camões (um descendente de Vasco Pires de Camões, alcaide-mor de Portalegre? um ascendente do poeta autor d’ Os Lusíadas?) “em toda a Sua vida por Provedor da capella de Sancta Maria de Alegrete, e todolos bens que a ella pertencem”. Na mesma carta, este fidalgo (“cavaleyro de nossa caza”) é autorizado a “arendar, e desarrendar, aforar, e desaforar, e fazer dos bens da dita Capella todo o que Sentir que he bem, e proveyto della”, mas com uma condição: “que o dito Lopo váas Levante a Igreja, e ponha em ella cálix, e vestimenta, e todalas outras couzas que á dita Capella cumprirem”. E ainda com a obrigação de mandar dizer “cada Sabádo em cada huma Semana huma missa, e mais todas as festas principaes de Santa Maria polas almas dos defuntos que os ditos bens Leyxarão à dita Capella”. O documento coloca-nos uma dúvida em relação à origem da igreja. D. Afonso V obriga Lopo Vaz de Camões a “levantar” o templo. Não sabemos no entanto se o verbo aponta para um construção nova, de raiz, ou para uma reconstrução. Colocamos no entanto a hipótese de uma existência anterior: em primeiro lugar porque o legado pio (anterior a 1477) necessitaria de um espaço específico para o cumprimento das obrigações religiosas a ele vinculadas; em segundo porque a invocação de “Santa Maria” é tipicamente medieval, muito anterior a uma data tão avançada quanto o último quartel de quatrocentos. Seja como for, parece-nos claro que após o diploma do rei Africano foi edificado um novo templo, devidamente equipado pelo provedor da capela nas suas necessidades materiais.
No primeiro quartel do século XVII a igreja de Santa Maria era descrita da seguinte forma: “Tem a dita capella a Irmida extramuros da dita villa de Alegrete á porta de Sancta Maria que tomou o nome desta mesma Irmida, a qual he huma Irmida de uma só nave”. Nessa data, nela celebrava missa quotidiana o capelão, havendo festa solene no dia de Santa Ana. Talvez por essa razão a invocação primitiva foi sendo substituída, ao ponto de só a mãe de Maria ser recordada a partir do século XVIII.
Este templo de Alegrete sofreu no entanto várias vicissitudes. Numa inquirição realizada a 23 de Dezembro de 1672, Manuel Soilheiro, sargento-mor da vila, com 61 anos, afirmava: “nesta villa extramuros havia huma Igreja, e se chamava a de Sancta Anna, a qual Igreja se derribou por cauza das guerras”. A guerra seria então a da Restauração. E é natural que uma igreja encostada às muralhas, junto de uma das suas portas, fosse atacada pelo inimigo – ou demolida pelos alegretenses, para não facilitar a entrada das forças opositoras no espaço muralhado. Noutra inquirição, realizada em 1712, Pedro Moreira (com 70 anos de idade) recordava no entanto “que o Capellão Manoel Rodrigues Reedificou a dita capella, de abobada a Igreja e huma sanchristia”.
A sorte da antiga igreja de Santa Maria não foi, no entanto, duradoura. Durante a Guerra da Sucessão de Espanha (1704-1713) o edifício foi demolido por razões de segurança: “por estar contigua ao castello […] se mandou derribar quando o inimigo na guerra passada prizidiou a praça de Arronches”. Não mais foi reconstruído.
O seu recheio foi então transferido para a igreja de São João Baptista, matriz de Alegrete. Aí, provisoriamente, continuaram a ser cumpridas as disposições dos instituidores da capela, mais precisamente no altar onde fora colocada a imagem de Santa Ana. Poucos anos depois, a escultura foi transferida para a igreja do Espírito Santo, onde passou a ser venerada em capela própria, dotada de sacristia particular, com entrada independente pela rua Direita da vila.
Com a implantação da República e profanação do templo onde se encontrava a imagem da avó de Jesus Cristo, esta regressou à matriz de Alegrete, local onde foi observada e fotografada por Luís Keil no início dos anos 40 do século XX (cf. Keil, 1943: 150). Em 1955 foi exposta ao público no Seminário Diocesano de Portalegre, no âmbito da mostra de Arte Sacra aí realizada aquando da inauguração desse edifício. Lamentavelmente, as autoridades eclesiásticas não mais a fizeram regressar à localidade para onde fora adquirida ou mandada esculpir, provavelmente por Lopo Vaz de Camões. Esteve ainda presente na exposição comemorativa do 450 da Diocese de Portalegre, realizada no ano 2000, não mencionando estranhamente o catálogo (organizado pelo padre José Patrão) a sua proveniência.
Esta peça do século XV é o último documento artístico proveniente da antiga igreja de Santa Maria de Alegrete: uma escultura gótica em pedra de ançã, policromada, com 76 centímetros, representando as Santas Mães (ver foto).



quarta-feira, 9 de dezembro de 2009


Póvoa e Meadas (Castelo de Vide):

retábulo da igreja de Nossa Senhora da Graça

(desaparecido)


Fotografia publicada em http://povoameadas.com.sapo.pt/



CAPELA DE SÃO BENTO
(Quinta de São Bento - Ribeira de Nisa)



A referência mais antiga que conhecemos à capela de São Bento deve-se ao padre Diogo Pereira Sotto Maior (1616). Descrevendo algumas quintas situadas nos arredores da cidade de Portalegre, depois de elogiar a grandeza passada da propriedade de Manuel de Sousa (hoje chamada "dos Cantarinhos"), afirma a dado passo:
"Além desta, está outra quinta quasi dous tiros de besta de distância, que se chama do Azambuja, onde está ua ermida do bem-aventurado Sam Bento, que também foi mui célebre e nomeada neste reino, quando seu dono a pessuía. Agora leva quasi o caminho da que acima fica tratado, porque também está meia arruinada" (Sotto Maior, 1984: 55).
A capela de São Bento, integrada na quinta do mesmo nome, propriedade de D. Isabel Maria Malato de Sousa, está hoje em bom estado de conservação. Apresenta, com poucas alterações, a arquitectura e a decoração com que foi edificada, provavelmente na segunda metade do século XVI.
Orientada para nordeste, a única fachada virada para o exterior é extremamente simples, lateral e a sudeste. Para além da porta, possui apenas uma janela de iluminação e uma pequena sineira de alvenaria. A entrada faz-se por um pequeno pórtico em granito chanfrado, pintado de amarelo, sobre o qual se ergue um interessante registo em azulejos polícromos de finais do século XVIII, assente sobre pedestal em forma de trono constituído por um conjunto de azulejos de figura avulsa representando flores. No painel figura a efígie do orago da capela, São Bento de Núrsia.








O interior é de pequenas dimensões. É coberto por uma abóbada de berço, com caixotões pintados de azul, decorados com estrelas pintadas de branco e molduras da mesma cor. Sem capela mor, o espaço de celebração está elevado em relação ao dos fiéis, acedendo-se a ele por três degraus de granito.
O retábulo, em talha polícroma, é de simples mas interessante factura, sendo certamente contemporâneo da construção da capela, embora repintado. Dentro do estilo comum na segunda metade de quinhentos, apresenta ao centro um nicho com a imagem do padroeiro, com pedestal já do século XVIII, ladeado por duas peanhas onde permanecem ao culto imagens de Nossa Senhora do Rosário (em madeira estofada, já barroca) e de Santa Rita (de roca). O conjunto é coroado por um tímpano semicircular, onde figuram alguns dos atributos de São Bento (a mitra e o báculo). A banqueta do altar é setecentista.
No lado esquerdo, em frente à porta de entrada, a capela possui ainda um púlpito com grades de madeira torneada e base de mármore. De destacar também os rodapés constituídos por azulejos azuis e brancos, do século XVII.
Na parede oposta ao altar mor rasgam-se dois vãos. Ao nível térreo a entrada para a antiga sacristia. No nível superior uma tribuna, com grade semelhante à do púlpito.
Segundo nos contou a proprietária, a Quinta de São Bento terá servido de refúgio a uma comunidade de beneditinos em fuga, certamente após a extinção das ordens religiosas (1834). Como o abade estava paralítico, foi necessário abrir a referida tribuna para que ele pudesse assistir aos serviços religiosos.
Tendo em conta a arquitectura pouco comum desta capela em relação ao modelo geralmente adoptado para os pequenos templos particulares, esta lenda coloca-nos dúvidas sobre qual teria sido realmente a origem deste edifício para além da sua (re?)construção no século XVI. As hipóteses seriam várias. Infelizmente não podemos confirmar por agora nenhuma delas.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009


Póvoa e Meadas (Castelo de Vide):

retábulo da igreja de São Sebastião (actual Misericórdia)

Castelo de Vide:
passo no largo de São João


Fotografia de Dias dos Reis
publicada aqui.
Castelo de Vide:
retábulos da igreja de São João Baptista

Fotografia de Dias dos Reis
publicada aqui.

Portalegre:

Alminhas na Estrada de Santana.

Fotografia publicada em:





Portalegre:
Oratório na fachada duma casa da rua do Bargado (actual rua França Borges).
Publicada aqui:
http://www.flickr.com/photos/60083277@N00/

O Estúdio Mário Novais, activo entre 1933 e 1983, produziu uma série de interessantes fotografias de Portalegre. Estão disponíveis aqui: http://www.flickr.com/photos/biblarte/sets/72157622583306698/detail/








Fotografias das ruínas da igreja de São Tomé (Portalegre)

tiradas por César Azeitona

e disponíveis em


sexta-feira, 4 de dezembro de 2009



EREMITÉRIO DE SÃO MAMEDE
(Reguengo)



São escassíssimas as informações existentes sobre a história do eremitério de São Mamede, situado a pouca distância do ponto cimeiro da serra do mesmo nome, na freguesia do Reguengo. Trata-se, todavia, de um raro exemplo desta tipologia de edifícios religiosos.
Sem indicar as fontes documentais ou lendárias em que se baseou, Galiano Tavares veicula no Album Alentejano a opinião de que se trata de um edifício bastante antigo, mosteiro "de monges beneditinos, fundado no VI ou VII século e destruído pelos mouros" (Tavares, 1934: 918). Por sua vez, Maria Tavares Transmontano dá conta da opinião de José Maria Cardoso, segundo a qual os habitantes do convento eram frades anacoretas (cf. Transmontano, 1997: 37). Destes dados, podemos apenas confirmar que no início do século XIX o cenóbio era ainda habitado por quatro ou cinco religiosos, que viviam como os do convento capucho da serra da Arrábida. Achados arqueológicos nas proximidades no pico da serra dão no entanto muito peso à possibilidade de este edifício ser o herdeiro indirecto de um ribat muçulmano que aí terá existido. (Lembremos que o antropónimo “Mamede” é, frequentemente, uma forma aportuguesada do nome do profeta do Islão, Maomé.) Não devemos esquecer ainda a hipótese de o culto de São Mamede neste local ter uma origem moçárabe, dada a inclusão deste santo nos seus calendários litúrgicos.
Se tivermos em conta a sua localização em sítio ermo e as características da arquitectura do pequeno mosteiro, somos da opinião de que estamos talvez em presença de um antigo eremitério. Lembremos que existem referências a este tipo de construções no concelho de Portalegre pelo menos desde inícios do século XIV. A existência do brasão de D. Frei Amador Arrais (1582 - 1597) indica que o edifício actual deve ter sido (re)fundado por ele.



A sua ocupação não terá sido permanente. Se no princípio de oitocentos lá estavam frades, em meados do século XVIII (1758) o convento estava desabitado, sendo então apenas uma ermida filial da paróquia de que ainda hoje faz parte, alvo de um culto fervoroso. Assim afirma o padre Francisco Xavier Freire na "Memória Paroquial" da freguesia de São Gregório do Reguengo: "Na Ermida de são Mamede se fás a sua festa no dia dezassete de Agosto a que concorre (sic) muytas pessoas de varias partes com suas ofertas de que se ajuda a tal festa" (Freyre, 1758 in Ventura, 1995: 108).
A fachada do convento de São Mamede é muito simples, remontando talvez a finais do século XVI, princípios do seguinte, embora com algumas modificações em época posterior. Ampla, possui três portas, que correspondem às três partes do edifício. Duas pequenas, a sul e a norte, pelas quais se acede à zona destinada aos frades e ao espaço dos romeiros, respectivamente. E a porta da igreja ao centro, em granito e de maiores dimensões, ladeada por duas frestas e decorada com uma cornija e uma cruz. No alinhamento desta entrada estão um óculo de iluminação e um florão; fotografias antigas documentam a existência de um campanário, de pequena dimensão, a coroar a fachada. Existe ainda uma pequena sineira, situada na direcção da porta por onde se entra na zona conventual.



Os compartimentos destinados à vida comunitária situam-se à direita dum longo corredor que dá acesso a quatro celas, cozinha, refeitório, forno e palheiro, tendo, à esquerda, uma porta para o templo e um confessionário.
Ao centro temos a igreja orientada para nascente, com nave e capela-mor, ambas cobertas por abóbadas de berço partindo de cornijas.
O acesso à capela-mor faz-se por um arco de volta perfeita marmoreado que, a partir das impostas, está decorado com volutas entrelaçadas, tendo no centro o emblema da Ordem do Carmo. O altar principal é de alvenaria marmoreada e pintada, com trabalho em massa no estilo barroco/rococó popular comum nos templos da região na segunda metade do século XVIII. Possui, para além de um nicho central que albergava a imagem de São Mamede, duas pequenas peanhas laterais e um sacrário. O tecto da capela possui um fresco de interessante factura com abundante decoração grutesca, tendo ao centro um medalhão onde figura Nossa Senhora do Carmo entregando o escapulário a São Simão Stock. Parece ser obra da segunda metade do século XVII.
Existem ainda dois altares colaterais. O da direita foi modificado no século XVIII, possuindo algum trabalho em massa típico da época. O da esquerda é mais antigo, talvez seiscentista, com decoração contemporânea da ornamentação do tecto da capela-mor. A banqueta deste altar está revestida por azulejos azuis e brancos. A nave possui ainda púlpito, através do qual se acede ao coro.
A norte do edifício temos mais duas salas: a sacristia e a "casa dos ramos". O acesso ao púlpito é feito por este último compartimento.
Nesta igreja tinham culto, para além do padroeiro, Nossa Senhora do Carmo e uma imagem de Jesus preso à coluna.
Assaltado e vandalizado há poucos anos, o edifício está neste momento abandonado, possuindo ainda assim um património interessante. A imagem de São Mamede, peça talvez do século XVI, é neste momento venerada na igreja do Reguengo.

O eremitério de São Mamede antes da sua vandalização (foto de António Mão de Ferro).

Uma fotografia antiga de S. Mamede
Fonte: http://www.facebook.com/groups/132856930151387/#!/photo.php?fbid=2606274323615&set=o.249504805092293&type=1&theater




Notas sobre a
IGREJA DE SÃO PAULO (Castelo de Vide)

A igreja de São Paulo – situada na ponta oeste da Serra de Castelo de Vide, no monte designado no século XII “rostrum de Melrica” – é hoje um edifício arruinado, a que com muita dificuldade se acede, devido à densa vegetação que o rodeia. Localiza-se sensivelmente no sítio onde, em 1509/1510, Duarte Darmas desenhou uma das atalaias de Castelo de Vide. É possível que parte do templo (a capela-mor) tenha aproveitado na sua construção o que restaria da estrutura militar de vigia. Os restos observáveis parecem apontar nesse sentido.
Construída provavelmente na segunda metade do século XVI, a igreja tinha quatro compartimentos de pequena dimensão, reconhecíveis ainda hoje nas ruínas: nave única, capela-mor, sacristia e um outro espaço cuja funcionalidade desconhecemos, talvez a casa do ermitão.
Não existem quaisquer indícios que nos permitam vislumbrar como seria a fachada do templo, virada sensivelmente a nascente, ou a sua cobertura. A capela-mor é quadrangular e era coberta por uma cúpula hemisférica, de que ainda restam vestígios caiados.
Trata-se de uma capela filiável nas cubas mouriscas, de que existem numerosos exemplares por todo o sul de Portugal. Só no concelho de Castelo de Vide existem pelo menos mais dois, infelizmente também arruinados: as ermidas da Senhora das Virtudes (no Vale da Bexiga) e de São Silvestre (junto da estrada para a Póvoa), a que se pode ainda juntar a ousia de Nossa Senhora da Penha, embora seja circular. Perto, no concelho de Portalegre, temos ainda a capela lateral da Senhora da Alegria, na igreja de Carreiras, e as ruínas da pequenina igreja de São Tomé, no cimo do monte da Penha. Sem sabermos até que ponto são apenas emanações tardias da tradição moura ou vestígios antigos de espaços cultuais do islamismo fatimida, depois cristianizados, estas estruturas são de qualquer modo uma reminiscência histórica e arquitectónica das ermidas muçulmanas, relacionadas com cultos populares islamizados ou integráveis num islamismo muito heterodoxo, próximo do sufismo. Nas palavras de Artur Goulart de Melo Borges, são constituídas por “um corpo cúbico com uma cobertura cupular hemisférica, forrada exteriormente ou por simples reboco deixando ver a sua forma característica, ou por telhado de quatro águas escorrendo em curvatura ao jeito da cúpula” (Borges, 1985: 198). Simultaneamente oratórios e postos de vigia militar, neles vivia “um santo asceta – morabito ou marabuto – que aí recebia e orientava os fiéis e onde poderia vir a ser sepultado, continuando assim esse lugar a ser objecto de veneração. O termo morábito passou inclusivamente a significar também o próprio edifício” (Borges, 1985: 200). De acordo com este investigador, estas estruturas podem dividir-se em várias tipologias, dependendo da sua localização estratégica. A igreja de são Paulo de Castelo de Vide pertence à tipologia 1A, dado que tem uma situação estratégia em altitude pronunciada, permitindo abranger vasta panorâmica, associada ao isolamento. As outras tipologias são as seguintes: 1B, se a situação em altitude está ligada a uma localização na periferia dos povoados; 1C, se a altitude se junta a uma localização no interior das povoações; 2, se estão isoladas, mas sem altitude, associadas a estradas, rios ou atalaias; 3A, se não têm situação estratégica aparente e existem na periferia dos povoados; e 3B, se se localizam nos povoados, sem situação estratégica vislumbrável (cf. Borges, 1985: 200-201).
Não se sabe ao certo quando se deram o abandono e a ruína desta pequena igreja de Castelo de Vide (cujas ruínas necessitam de conservação e valorização). Cremos, no entanto, que terão ocorrido já em finais do século XVIII ou no século XIX, dado que em 1758 a ermida de São Paulo ainda era alvo de culto.

Bibliografia consultada:
Borges, Artur Goulart de Melo (1985) – “As ‘kubbas’ alentejanas – Monumentos de origem ou influência muçulmana no Distrito de Évora”. Actas do Congresso sobre o Alentejo – Semeando novos rumos, primeiro volume, Évora, Outubro: 198 – 202.
Cid, Pedro (2005) – As Fortificações Medievais de Castelo de Vide. Lisboa, IPPAR.
Trindade, Diamantino Sanches (1989) – Castelo de Vide – Arquitectura Religiosa, vol. 1. (2ª edição), Lisboa, Câmara Municipal de Castelo de Vide.


IGREJA DE SÃO MATEUS (PORTALEGRE)

Nascida no espírito de renovação artística ocorrido em Portalegre na segunda metade do século XVI, a partir da criação da diocese, a igreja de São Mateus situa-se na antiga Corredoura de Cima, hoje avenida George Robinson, na vizinhança do antigo Mosteiro cisterciense de Nossa Senhora da Conceição, fundado por D. Jorge de Melo.
Templo de pequenas dimensões erigido dentro do espírito renascentista, deve remontar ao último quartel da centúria de quinhentos.
Do programa arquitectónico original resta-nos apenas o pórtico em granito, ao qual se acede por dois lanços de escadas laterais pelos quais se sobe até ao patamar de entrada. Tendo como decoração uma concha, como insígnia da Ordem de Santiago (dada a filiação desta igreja na paróquia de São Lourenço, dos Espatários), é assim descrito por Luís Keil (Keil, 1943: 128):
"O pórtico foi construído no gosto dos fins do Renascimento, com arco de volta redonda com dois medalhões circulares nos cantos, colunelos suportando a arquitrave e, sobre esta, um frontão / com volutas e conchas rematado por uma esfera. Aos lados vêem-se duas esferas maiores."
A restante fachada (completada por uma pequena e singela sineira ligeiramente recuada) é bastante posterior, com destaque para o janelão emoldurado por decoração em massa, obra do século XVIII, época em que São Mateus foi, se não reconstruída, pelo menos remodelada na sua quase totalidade.
Possuía em 1758 os seguintes altares, ainda hoje existentes: "São Matheos como altar mor, e dois colatráis, à parte do Evangelho, a vera Cruz, e à parte da Epistola Santo Antonio [...]" (Sequeira, 1758 in Ventura, 1995: 128).

O interior apresenta a imagem que lhe foi dada no século de setecentos. Nave e capela-mor estão cobertas por abóbadas de berço, com sanca, sendo a do espaço destinado aos fiéis ligeiramente abatida. Os retábulos dos altares são de alvenaria pintada e dourada, com colunas marmoreadas e frontões interrompidos. Desde aqui até aos tectos, passando pelos rodapés, por um janelão oval fingido sobre a porta de entrada e pela moldura do arco que dá acesso ao presbitério, o trabalho decorativo em massa é elegante e abundante. A igreja possui ainda um púlpito destituído de interesse e uma pia de água benta concheada em mármore.
De entre o recheio da igreja de São Mateus são de destacar as seguintes peças, a necessitarem de uma exposição digna:
- a imagem do orago, em madeira pintada e estofada, do século XVII;
- uma escultura representando um santo franciscano (Santo António?), do século XVIII, em madeira e pasta de papel;
- e uma pintura sobre madeira, de razoáveis dimensões, obra com traços maneiristas, talvez de inícios da centúria de seiscentos, representando a Ressurreição de Cristo.
Este templo portalegrense esteve aberto ao culto até há poucas décadas. Está hoje fechado e sem prática religiosa, servindo de arrecadação e de espaço para a realização de algumas actividades de catequese organizadas pela paróquia de São Lourenço. Precisa sobretudo de limpeza e de obras de conservação no interior e no exterior.



IGREJA DE SÃO PEDRO
(Alegrete, Portalegre)


Segundo uma velha lenda conhecida na região, a igreja de São Pedro terá sido na Idade Média a primeira sede paroquial de Alegrete. Se fizermos fé nesta hipótese, ela remontará então ao século XIII, a tempos anteriores ao reinado de D. Dinis, responsável pelo foral dado a Alegrete e pelo urbanismo gótico do espaço situado dentro das muralhas desta vila, antiga sede de concelho, hoje integrada no território de Portalegre.
A construção arruinada que hoje podemos observar não deverá no entanto ir além de finais do século XV, como confirma Luís Keil (cf. Keil, 1943: 150), tendo sido alvo de remodelações nas centúrias seguintes.
A igreja é constituída por galilé, nave, capela-mor e sacristia. Teve ainda uma pequena sineira (de que não restam quaisquer vestígios), como parece indicar um dos sinos existentes na torre do relógio de Alegrete, datado de 1668 e dedicado a São Pedro.
A galilé possui arcos de volta inteira em alvenaria. Deve ser obra de meados do século XVI, embora existam ainda vestígios de uma construção anterior com a mesma função.
A entrada na igreja faz-se por um portal em arco de asa de cesto, em granito aparelhado, com esquinas chanfradas. É ladeado por duas pequenas janelas e sobrepujado por outra de maiores dimensões.
A capela-mor é o espaço mais interessante desta igreja. O arco do cruzeiro é de volta perfeita assente sobre pilastras, em granito aparelhado, co
m esquinas chanfradas, arrancando de impostas decoradas com motivos vegetalistas (quadrifólios) e antropomórficos. É coberta por uma abóbada de berço, com sanca saliente, inteiramente decorada com esgrafitos imitando os tectos apainelados. Possui no centro uma pintura em tons de ocre, posterior, representando um brasão com os atributos de São Pedro (as chaves). Esta parte da igreja foi, até à Primeira República, em grande parte coberta por azulejos de tapete, azuis e amarelos, de que restam hoje apenas parcos vestígios. Com a retirada dos mesmos foi posto a descoberto um importante conjunto de painéis em pintura mural, representando maioritariamente passos da vida do padroeiro da igreja. A decoração mural ocupava a totalidade das paredes laterais e estendia-se ainda à parede fundeira desta capela, onde - para além da banqueta do altar - se situava o nicho que albergava a imagem de São Pedro, sobrepujado por um óculo, hoje cego.
No corpo da igreja existem restos de dois pequenos retábulos colaterais, elaborados em alvenaria, dentro do estilo comum na região durante o século XVIII, na linha do barroco / rococó populares. Esta parte do templo era coberta por um tecto de madeira, hoje desaparecido com o púlpito, de que restam ainda vestígios. É possível que as paredes laterais desta parte do edifício tivessem também decoração em pintura mural, entretanto coberta pela cal, que ainda subsiste. A entrada lateral para a nave, situada à direita de quem olha para a capela-mor, é guarnecida no exterior por um pequeno pórtico em cantaria com arco abatido e esquinas chanfradas, típicos do século XVI, em cujo alinhamento existe ainda uma cruz esculpida em granito.
A igreja de São Pedro, aberta ao culto até ao início do regime republicano, foi em grande parte destruída e vandalizada nas décadas seguintes. Quando em 17 de Março de 1945 se lavrou o auto de entrega e restituição deste templo à comissão fabriqueira da paróquia de Alegrete, estava já "em completo estado de ruinas" (Maçãs, 1991: 26). Os azulejos do século XVII tinham desaparecido em mãos desconhecidas. O restante recheio fora recolhido na igreja paroquial.

A mais notável de todas as peças pertencentes a esta igreja é a imagem do padroeiro, hoje venerada no antigo altar de São Miguel na igreja matriz de Alegrete. Envolta em lendas, certamente relacionadas com a sua beleza escultórica, era considerada em 1758 como "Angelical" (Rebello, 1758 in Ventura, 1995: 100). Trata-se de uma imagem sedente de São Pedro investido na função papal, escultura gótica em mármore policromado, datada de finais do século XV, segundo proposta de Luís Keil (cf. Keil, 1934: 150).
IGREJA DE SÃO BARTOLOMEU (PORTALEGRE)

Já existente no século XVI, a igreja de São Bartolomeu foi construída extramuros no local onde a tradição coloca o nascimento de Portalegre, denominado "Portelos" em 1304. É no entanto difícil precisar quer a época da sua construção. Pertencente à freguesia de São Lourenço, é estranho que dela não faça menção o padre Gregório Pegado Sequeira.
Alguns documentos permitem-nos afirmar que este templo portalegrense foi certamente demolido depois da implantação do regime republicano em Portugal, pois ainda em 1911 estava aberto ao culto, com comissão de festas que tinha como objectivo honrar São Bartolomeu apóstolo.
O arrolamento dos seus bens, ocorrido a 4 de Agosto do ano referido, veio dar cumprimento à Lei de 20 de Abril de 1911, vulgarmente chamada Lei da Separação da Igreja do Estado, que nacionalizou os bens eclesiásticos. Este documento, existente em duas versões ambas guardadas no Arquivo Distrital de Portalegre, é assinado na sua versão mais reduzida por Luís de Sousa Gomes, Jorge Maria de Macedo e Francisco Fino. Na sua versão mais completa é subscrito por João José Cabecinha, presidente da comissão dos festejos a S. Bartolomeu.
É este último que nos permite termos uma imagem, ainda que imperfeita, da arquitectura e da decoração deste edifício religioso de que nos resta apenas uma memória toponímica.
A igreja era constituída por nave, capela mor e sacristia. No altar principal estava a imagem do apóstolo São Bartolomeu, acompanhada por estátuas representando São Francisco Xavier, Santo Inácio de Loyola, São Joaquim e São Macário. À entrada deste espaço estavam dois anjos, provavelmente ceruferários.
No corpo do templo existia, para além do púlpito, um oratório representando o Calvário, onde adivinhamos interessante factura, se atendermos à descrição elaborada por João José Cabecinha: "colocado dentro da parede da Egreja, com duas portas de madeira ordinaria, tendo as mesmas portas no entrior umas imagens pintadas a oleo, o oratorio é uma espece de capella em ponto piqueno com colunas todo dourado, dois castiçaes de vidro, um Christo ao sentro, de madeira com cruz tambem de madeira, o Christo tem um diadema de práta com uma pedra sem valor, com Nossa Senhora e S. João aos lados".
No exterior a igreja tinha uma torre sineira com um único sino, o qual - segundo se diz - foi fundido com outros para a construção do monumento aos mortos da Grande Guerra.
Ao seu recheio pertenciam peças certamente interessantes, a avaliarmos pelo inventário: um cálice de prata lavrada com patena, dois relicários em prata de São Bartolomeu e de São Francisco Xavier, diversos paramentos, duas pirâmides de madeira para as relíquias e para a colocação de uma imagem do orago, uma imagem de são João (Baptista?) em barro de Portalegre, etc.. De nenhuma delas existe rasto seguro. Seriam sua pertença algumas das imagens hoje presentes nas colecções dos museus da cidade?
Demolida a igreja em data que não podemos precisar, os seus bens transitaram para mãos que por agora não estão identificadas. Foi esta a sorte de muito do património religioso de Portalegre e do seu concelho.
CAPELAS DE SÃO BENTO E DO SENHOR JESUS DA FORCA (PORTALEGRE)

São até agora escassas as fontes que nos falam das capelas de São Bento e do Senhor Jesus da Forca. Desconhecemos portanto quer a data a sua construção quer a do seu desaparecimento.
A primeira situar-se-ia ao cimo da actual Rua do Comércio, junto à Travessa de São Bento. Nela era rezada missa para os presos, estando defronte da cadeia da cidade.
Para dar assistência aos sentenciados com a pena capital, perto do Ribeiro de Baco situava-se a capela do Senhor Jesus da Forca. Abolida a pena de morte em Portugal em meados do século XIX, terá sido abandonada e utilizada com outras funções. Consta que há poucas décadas, quando foi construída uma nova rede viária na zona onde se situava, foi demolido um casarão que ameaçava ruína, tendo então aparecido vários fragmentos de azulejo. Seriam últimos vestígios da capela do Senhor Jesus da Forca?

DUAS IGREJAS DESAPARECIDAS
DA CIDADE DE PORTALEGRE


Ao lermos de forma cuidada o acervo documental preciosíssimo constituído pelas Memórias Paroquiais, escritas pelos diversos párocos do concelho de Portalegre em 1758 por ordem de Sebastião José de Carvalho e Melo, deparamo-nos com uma série de referências a várias igrejas e capelas de que hoje não resta qualquer presença física, mas apenas uma memória mais ou menos diluída, às vezes com vestígios na toponímia.
De entre elas, foram vários os edifícios a que perdemos o rasto dentro da própria cidade, levados alguns pela erosão do tempo e muitos outros pela incúria ou pela acção lesiva dos homens. Neste texto pretendemos sinalizar apenas algumas igrejas e capelas ainda existentes no século XVIII, deixando para ocasião posterior a referência a outros templos, nomeadamente às sedes de paróquia.

*

A igreja de São Lourenço do Picoto, tão pequena nas suas dimensões, já em 1552 dera origem na toponímia portalegrense à Rua de São Lourencinho - ainda hoje existente -, certamente o local onde se erguia. Situada muito próxima da Sé, era - na época - a única filial deste templo dentro das muralhas, como se pode ler nas palavras de Manoel Gonçalves Boroa: "Intramuros não tem esta freguezia Ermida alguma excepto a Igrejinha de são Lourenço a qual não consta tenha Padroeyro nem fabrica, nem há notícia da sua fundação [...]" (Boroa, 1758 in Ventura, 1995: 121). Desconhecendo-se a data do seu desaparecimento, segundo uma tradição quinhentista difundida entre os cristãos-novos elevar-se-ia no local onde antes existira a sinagoga da judiaria de Portalegre (cf. Tavares, 1989: 39). A sua construção remontaria, por isto, aos primeiros anos do século XVI, depois da conversão forçada dos judeus ao cristianismo ocorrida por ordem do rei D. Manuel após 1496.



A igreja de Santo André foi demolida em 1973, embora nessa época dela restasse apenas a estrutura, abandonada e profanada depois da implantação da República. Existente já na segunda metade de quinhentos, com fachada virada a poente, elevava-se a norte do Rossio do Espírito Santo, freguesia de São Lourenço - no local onde hoje está o edifício dos Correios. Tinha três altares em 1758: "santo Andre Apostolo como altar mor, e dois colatrais, à parte do Evangelho a Senhora da Graça, e à parte da Epistola São Simão" (Sequeira, 1758 in Ventura, 1995: 128).

(Na imagem: aspecto do Rossio de Portalegre; na parte cimeira, observa-se uma habitação com quatro janelas: trata-se de um vestígio da igreja de Santo André, então já profanada e transformada.)

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009


IGREJA DE SANT' IAGO MENOR
(Santiago de Caiola - Urra)



A referência mais antiga que conhecemos à igreja de Sant' Iago Menor data de 11 de Agosto de 1565. Trata-se de um assento de casamento, registado pelo padre Jorge Soares nos livros de São Martinho de Portalegre, pelo qual ficamos a saber que nesse dia "Recebeo o padre joão serra [coadjutor da mesma paróquia] em samtiago de caiola a joão martins e a graçia miranda do monte da Vrra por marido & molher". Não sabemos qual seria a antiguidade deste templo nessa data. Deduzimos no entanto deste documento que o mesmo seria filial da sobredita freguesia citadina. Este facto parece confirmado por um acordo celebrado em 1501 entre os párocos de Portalegre, no qual atribuiram ao prior de São Martinho o encargo de administrar os sacramentos aos que moravam "do caminho do Cratto levando o termo ao redor ate o caminho de Arronches" (S/A, 1983).
O edifício que se podia observar até há poucos anos parecia confirmar uma edificação que remontaria a meados do século XVI, embora interiormente tenho sofrido grandes modificações. Esta datação é confirmada por Luís Keil (cf. Keil, 1943: 152).
A fachada principal - bastante simples - parecia ser, com poucas alterações, a original. Virada a sudeste, era ladeada por uma pequena sineira em alvenaria. Possui uma porta com guarnição granítica, ainda com vestígios da primitiva moldura chanfrada, e uma janela de iluminação no mesmo alinhamento. Modernamente, haviam sido aí colocados dois pequenos registos de azulejo, representando imagens veneradas no interior (o orago e Nossa Senhora das Mercês).
O interior, de uma só nave, havia sido quase completamente remodelado durante a segunda metade de setecentos e restaurado já no século XX. Luís Rodrigues Galego, pároco em Sant' Iago de Caiola no ano de 1758, descreve o templo com as seguintes palavras:
"O orago, ou padroejro da mesma Igreja he sãao Thiago menor tem altar mór, e dois Colatrais; o mór tem hua imagem de Christo Cruxificado em vulto, Nossa Senhora das Mercês, são Thiago Menor, são Pedro, e são Ioão Baptista tãobem em vulto; o altar do lado do Evangelho sancto Antonio; e o da Epistola Nossa senhora dos Prazeres; hua e outra a Imagem tão bem em vulto; toda a Igreja não tem repartição alguma, e Consta sò de huma Nave" (Galego, 1758 in Ventura, 1995: 117).
Com coro sustentado por um arco abatido e pia baptismal à esquerda de quem entrava, a imagem até há pouco tempo não era muito diferente. Apenas algumas das imagens expostas à veneração haviam mudado, seguindo o gosto da época. Os retábulos, principal e colaterais, eram todos em alvenaria dourada e pintada, seguindo o estilo comum na região durante da segunda metade do século XVIII: nicho central ladeado por colunas, frontão elevado ou interrompido. O púlpito era da mesma época e construído nos mesmos materiais e com decoração semelhante. Merece realce no entanto o frontal do altar-mor, "de gesso dourado, tipo espanhol do século XVII" (Keil, 1943: 153). Na capela-mor encontravam-se ainda dois baldaquinos, em madeira pintada e dourada, no estilo neo-gótico oitocentista.
De entre as diversas imagens expostas na igreja, merecem referência as que representam Sant' Iago Menor e São Pedro, esculturas "redondas" situadas na transição do século XVI para o seguinte - infelizmente desvalorizadas por restauros executados sem nenhum critério.
Pequeno para a população da freguesia da Urra, há poucos anos o corpo da igreja foi completamente reconstruído, a partir de uma iniciativa do padre Marcelino Marques, passando a ter três naves. A nova fachada, completamente nova, reproduz num tom contemporâneo a antiga.
CAPELA DE NOSSA SENHORA DE BELÉM
(Covas de Belém - Portalegre)



A capela particular de Nossa Senhora de Belém está situada a escassos quilómetros da cidade de Portalegre, numa quinta erguida na encosta da serra, em local hoje conhecido pelo topónimo Covas de Belém.
O único documento de que temos conhecimento sobre este edifício é assinado em 1758 pela mão de Manoel Gonçalves Boroa, pároco da Sé, freguesia a que pertence. Trata-se de uma passagem da "Memória Paroquial", que diz o seguinte:
"A Ermida que ao prezente há nesta freguezia mais frequentada das romagens he a de nossa senhora de Bellem, que em huma quinta sua fundou nas faldas da serra de Portalegre o Padre Frey Iozé do Sacramento Relligiozo da Órdem de são Ioão de Deos haverá trinta e sinco annos pouco mais ou menos, á qual em todo o tempo do anno concorre muyta gente em romaria assim da cidade, como desta Provincia, e ainda muyta do Reyno de Castella parte atrahidos da amenidade do sitio, e parte dos muytos milagres que fás a Imagem da senhora ou Deos por sua intercessão, da quinta em que ella está situada, he ao prezente possuidor o Reverendo Padre Iozé Meyra Barreto."
Os dados aqui presentes não contrariam aqueles que ainda hoje podemos observar no pequeno edifício, ladeado por duas habitações modestas, enquadrando um pátio soalheiro virado a sudoeste.
Trata-se, de facto, de uma capela edificada na primeira metade do século XVIII, quer pela sua estrutura arquitectónica em estilo chão, quer pela inscrição esculpida no lintel da porta de entrada: "F. [?] J. - N. S. DE BELEM 1723". As primeiras consoantes abreviadas deverão pertencer ao nome do fundador - Frei José do Sacramento. A restante legenda corresponde, como é bom de ver, ao orago da casa e ao ano da fundação - 1723.
O templo, de reduzidas dimensões, é constituído por dois volumes que correspondem às divisões do interior. O espaço antigamente destinado ao culto é constituído por nave e capela mor, separadas por um arco de volta perfeita saliente, tudo coberto por abóbadas de berço.
A fachada é dominada pela sua única porta, emoldurada por granito da região, com bases pouco salientes e decoradas por elementos geométicos, encimada por uma cornija - mantendo o gosto de finais do século XVII. A toda a largura da mesma corre uma outra cornija, em alvenaria, sobre a qual se ergue um frontão ligeiramente recortado, com ténues vestígios de decoração em massa. Nele se inscrevem um óculo de iluminação e um nicho. O conjunto é completado por três pináculos assentes sobre plintos, um no vértice e dois nas extremidades.
A imagem de Nossa Senhora, exposta no nicho da fachada, é uma peça em barro esculpida a meio corpo, na qual se observa a Virgem com cabeça inclinada coberta por manto, segurando com a mão direita o corpo do Menino que a abraça junto ao pescoço. Dotada de uma expressividade tipicamente barroca, cremos tratar-se de uma escultura saída da mão de barristas locais, embora com algumas características que a distinguem de outras congéneres conhecidas.
A capela de Nossa Senhora de Belém - a necessitar de conservação - foi transformada pelo seu proprietário, já no século XX, em lagar de vinho, servindo presentemente como arrecadação para os rendeiros da quinta.
Apesar da profanação, subsistia ainda há poucos anos - como vislumbre do espírito religioso - a devoção de um velho pastor que, todos os anos pela noite de Natal, alumiava a Senhora com uma lamparina de azeite.
CAPELA DE NOSSA SENHORA DAS DORES
(Quinta da Lameira - Reguengo, Portalegre)



Integrada no solar da Quinta da Lameira, a capela de Nossa Senhora das Dores situa-se na freguesia do Reguengo.
A casa nobre de que faz parte foi fundada e edificada no último quartel do século XVIII, mais precisamente no ano de 1783, conforme se pode ler em lápide de mármore colocada sob o brasão dos proprietários: "IOAO DA FON[SECA] ACHIOLI / COU[TINH]O E D. MARIA SERGIA / ACHIOLI DE SOUZA TAVA- / RES FIZERÃO NO ANNO / DE MDCCLXXXIII". Trata-se de um edifício alongado, com um só piso na fachada principal, possuindo em cada extremidade dois corpos mais elevados.
O pequeno templo particular situa-se a poente, com entrada pelo exterior, orientado no sentido Norte - Sul. A fachada é ladeada por pilastras de alvenaria pintada, sendo a porta de entrada e a janela de iluminação debruadas por molduras em granito lavrado ao gosto barroco da época da fundação. O conjunto é encimado por um beirado ornamental, sobre o qual se ergue um frontão recortado, cuja ornamentação é feita por algum trabalho em massa, simples, com espirais emoldurando o conjunto e - no tímpano - um óculo falso ladeado por elementos fitomórficos. A decoração é completada por acrotérios: uma cruz no do vértice e dois pináculos nas extremidades.
O interior é de pequenas dimensões, com tribuna sobre a entrada.
Possui um retábulo barroco de finais do século XVIII, em alvenaria pintada e dourada, com um nicho central ladeado por colunas e duas peanhas. Nele está exposta à veneração a "Virgem da Lameira" - Nossa Senhora das Dores - escultura em madeira estofada, de excepcional beleza e dramaticidade, com resplendor e setas em prata, atribuída - segundo Luís Keil - ao escultor Machado de Castro (cf. Keil, 1943: 152). Para além desta peça, são ainda de destacar as imagens de São João Baptista e de São Diogo, mais pequenas, também do século XVIII, de interessante mas mais simples factura.
As paredes de capela estão revestidas por seis painéis de estuque representando cenas da vida de Jesus Cristo, nomeadamente algumas das dores de Nossa Senhora, em coerência com o orago. No lado direito temos o encontro de Cristo com as mulheres de Jerusalém e Jesus crucificado a quem um soldado estende uma cana com esponja na extremidade para lhe dar de beber. No lado esquerdo observamos o Menino entre os doutores e a descida da cruz. Nestas paredes laterais estão duas portas (sendo uma delas falsa) sobre as quais existem ainda dois medalhões ovais representando a fuga para o Egipto e Santa Maria Madalena.
Ao culto nesta capela de Nossa Senhora das Dores está ainda uma imagem do Senhor da Paciência, exemplar dos chamados "barros de Portalegre" - em cor natural.
Estruturalmente o seu estado de conservação é bom, necessitando no entanto de restauro no altar e nos estuques.


IGREJA DO MÁRTIR SÃO SEBASTIÃO
(Carreiras, Portalegre)



De acordo com os dados disponíveis, é difícil determinar a data da edificação da igreja de São Sebastião das Carreiras. Há porém uma lenda que a faz remontar aos tempos imemoriais em que a aldeia terá sido fundada.
Os diversos indícios documentais não permitem no entanto que recuemos para além de finais do século XV. É possível que já existisse em 1501, ano em que os priores das igrejas de Portalegre dividiram entre si os moradores (mais concretamente, os moleiros) que viviam na área rural do concelho. Nesta data é atribuído ao pároco de São Lourenço o encargo de administrar os sacramentos aos que moravam entre o caminho de Marvão e o caminho de Castelo de Vide, área hoje em parte pertencente à freguesia de Carreiras (cf. S/A, 1983). Em 1544, antes mesmo da criação da diocese, era já sede de paróquia.
No início da década de 1580 as cartas nascidas da presença nesta igreja do visitador ou do bispo de Portalegre, mostram-nos um templo que ameaçava ruína nas paredes e no tecto - prova da sua antiguidade. É nesta altura que D. Frei Amador Arrais ordena aos mordomos do Mártir Santo que a reparem, recolhendo fundos entre a população, dando assim cumprimento a um acordo antigo entre os moradores da aldeia e o pároco de São Lourenço da cidade, de que fora filial. As obras concluíram-se em 1584, mas anos depois foram necessárias novas reparações. Em finais do século XVI a igreja tinha três altares: o maior, o de Santo António e o do Nome de Jesus. Nesta altura terá sido também construída a capela de Nossa Senhora da Alegria, então provavelmente com outra invocação mariana, embora os documentos sejam silenciosos a seu respeito.
Em 1629 foi alvo de nova reparação, embora não saibamos que alterações trouxe. À primeira metade do século XVII pertence ainda o retábulo da capela mor, que terá sido posteriormente modificado para a instalação do trono.


Retábulo da capela-mor (meados do século XVII)
(Foto de RV)
 Em meados do século XVIII o templo precisava de novas obras de beneficiação e de ampliação. Comparado em 1758 a uma ermida, continuava com três altares (sendo os laterais agora dedicados a Nossa Senhora e a Santo Cristo ou Senhor da Paciência). Carecia no entanto de um baptistério e de um campanário onde o sino se pudesse tocar por fora, para além de outras carências menores. A comunidade, aliada ao padre Alexandre Xavier Ferreira, decide então reconstruir a igreja. As obras iniciam-se em 1771, sendo concluídas só em 1778, devido à escassez de recursos. A altura e o comprimento são aumentados, ficando com uma nova fachada dotada de torre sineira.
Foram de pouco vulto as alterações que sofreu até à década de 1960. A partir desta data, o corpo da igreja é descaracterizado, com a eliminação dos altares laterais e a substituição do tecto de madeira por betão armado.



Estamos perante um templo de pequenas dimensões, constituído pela aglomeração de vários volumes em torno da nave e da capela mor. Entre eles destacam-se a torre sineira, a capela lateral de Nossa Senhora da Alegria e o trono, para além de outras dependências, como o baptistério.


Retábulo da capela de Nossa Senhora da Alegria (1ª metade do século XVII)
(Foto de RV.)

A fachada é virada a poente e apresenta as feições que recebeu na década de 70 do século XVIII. Apresenta um portal em granito de grão fino, com bases abauladas e sanca, sobrepujado por um registo em azulejo de meados do século XVIII representando o Mártir São Sebastião e por um óculo de iluminação. O campanário situa-se a norte, com três sineiras (uma delas tapada), rematado por uma pirâmide quadrangular com toscos pináculos em granito nos vértices e cata-vento.


Registo de azulejos na fachada (meados do século XVIII, oficina lisboeta).
(Foto de RV)

A nave foi quase totalmente adulterada na segunda metade do século XX. Apresenta uma cobertura de betão onde antes estava um tecto de asna em castanho. Possuía dois retábulos laterais em madeira, de finais de setecentos, dedicados à Senhora do Rosário e a Santo António - recentemente desaparecidos. Nela se pode observar ainda o púlpito, com base em cantaria e balaustrada de madeira pintada. O coro foi reconstruído há poucos anos.
No lado norte situam-se vários corpos anexos. Destacamos, em primeiro lugar, o baptistério, com pia instalada em 1901 e gradeamento em madeira torneada datado de 1782. De seguida a capela dedicada desde o século XVIII a Nossa Senhora da Alegria: uma construção de inspiração islâmica, com planta quadrangular e cúpula hemisférica assente sobre pendentes, onde merece relevo o pequeno retábulo maneirista inspirado em obras do escultor Gaspar Coelho, mestre de vários altares da Sé de Portalegre. Este espaço foi decorado com pinturas murais, ainda existentes, mas completamente caiadas.
A capela-mor é o espaço mais preservado da igreja. Apresenta um tecto pintado a fresco por mão regional, com abundante decoração grutesca fitomórfica que enquadra as representações de São Sebastião e São João Baptista, ladeando uma custódia - numa alusão ao Santíssimo Sacramento. O retábulo, embora recebendo inspiração do maneirismo de Gaspar Coelho, é uma obra já da primeira metade do século XVII ou posterior. Duas grandes pinturas sobre madeira, ladeadas por colunas, representam São Gregório Magno(ou São Silvestre) e São José, num conjunto coroado por uma outra em hemiciclo onde figuram São Miguel e outros anjos salvando as almas do Purgatório. Ao centro temos o arco de abertura para o espaço do trono, com abóbada também possuidora de frescos com volutas. O sacrário actual foi ali colocado na década de 1940, sendo ladeado por esculturas de vulto pleno representando São Sebastião e o Menino Deus.
Do recheio deste templo destaca-se a sua colecção de esculturas, com peças dos séculos XVI, XVII e XVIII, entre as quais sobressaem as representações do padroeiro e da Senhora do Rosário, de excepcional qualidade, e duas peças pertencentes aos "barros de Portalegre" (Sant' Ana e Santo Isidro). Merecem também relevo algumas peças de ourivesaria, nomeadamente uma custódia em prata dourada, do início de seiscentos.
O estado de conservação é muito bom, necessitando porém de restauro criterioso os retábulos e algumas das imagens aí veneradas.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

APONTAMENTOS
SOBRE A HERDADE DE JOÃO MARTINS
(Carreiras, Portalegre)



Situada na freguesia de Carreiras, no sopé da Serra de São Paulo, junto do caminho que separa os concelhos de Portalegre e de Castelo de Vide e perto de uma linha de água importante (a ribeira “de Nisa”), a herdade denominada “João Martins” reserva entre os seus limites alguns dos vestígios mais remotos dessa parte do Norte Alentejano, entre os quais se destacam mós neolíticas, uma anta e restos de povoamento da Alta Idade Média, nomeadamente chafurdões. Possui ainda vestígios de construções mais recentes, talvez do século XV.
Não é possível explicar sem dúvidas a origem do seu topónimo, uma vez que não surge na documentação antiga. Não será no entanto impossível relacioná-lo directamente com um tal “João Martins”, lavrador nascido por volta de 1481 e morador nos “Montes do Carreiro” (hoje “Carreiras”), que em 1511 foi nomeado pelo rei D. Manuel I – com outros habitantes do concelho de Portalegre – “besteiro do monte”, por carta passada em Évora no dia 28 de Fevereiro desse ano, assinada por Garcia de Melo.
A par dos besteiros urbanos – que pertenciam, nas vilas e cidades medievais, a uma “aristocracia popular”, pois sendo atiradores de besta constituíam uma espécie de milícia de elite, recrutada entre indivíduos de certa posição (segundo afirma Sérgio Luís Carvalho) – os “besteiros do monte” seriam talvez responsáveis pela segurança das populações residentes nos meios rurais, sobretudo nos “montes” (palavra que, na Idade Média, designava uma pequena aldeia).
Para além do referido, pouco mais sabemos sobre “João Martins”. Temos apenas conhecimento de que um seu filho possuía, em 1548, uma propriedade nas proximidades do caminho de Marvão e da dita ribeira de Nisa.




EXTRACTO DO DOCUMENTO DE D. MANUEL I


“Dom manuel & etc. Hum priujlegio de besteiro do monte em […] / […] em euora a xxbiij de feuereiro de bxj e asynado per / graçia de Mello […] /
[…]
Dom manuell & etc. Hum outro tall a Joham martjnz laurador morador nos momtes do carreiro termo / de Portalegre de jdade de xxx annos e fez per o dito espriuao no dito Dia mes e era sobredita / e asynado per o sobredito /
[…]”

(Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Chancelaria de Dom Manuel, Liv. 41, f. 21 v. – microfilme 2235.)

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